sexta-feira, 31 de julho de 2015

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assim é que há muito

beijo santos desejando pedras.

nadainda me saliva
fazendo doer as mandíbulas.
ou desfaz o desejo insano
de querer seu ferro de marcar bicho
curando minha chaga,
tatuando seu desejo em cada poro aberto.

nada,
como seus olhos sobre os meus deitados,
varando as portas ao meio : :

fábio gondim
ferrete

"Corpo Anônimo 3" de Ton Barbosa

segunda-feira, 13 de julho de 2015

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alguns dias depois,
duma ripa de costela cria o culpado.
dois mil anos atrás
recorre ao mesmo artifício dramático.
na penteadeira de deus,
dentro da gaveta dos homens,
uma fortuna em pedras de naftalina
a disfarçar o cheiro das peles em chagas
fábio gondim
maçã e moedas
"Corpo Anônimo" de Ton Barbosa

domingo, 12 de julho de 2015

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fazem planos pra serem içados aos céus,
escolhidos a dedo de deus.
plano que tantos querem
e que fato é certo destino,
a muitos será ingrata decepção
por se tratar de pura poesia.
o perfume molesto que ora cambaleia
será só mais um perfume no seio de deus.
o cristo, autor tão adorado,
já dava pinta disso em seus versos
carregados de linhas tortas
fábio gondim
perfume maldito
"Corpo anônimo 01" de Ton Barbosa


sexta-feira, 3 de julho de 2015

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contorcia-se feito porco esfaqueado,
roncava, grunhia,
cuspia angústia pelas ventas.
nada, nem sangue nem oxigênio
impediria a derrocada iminente.
inda estrebuchava relutante.
aquela que lhe era mais cara porém,
indiferente à sua dor
encharcava-se de perfume e creme
aprontando-se para o baile.
piorando seu circo de horrores,
pintava-lhe de pó e batom
a fazendo palhaça,
sufocando os grunhidos.
tarde demais.
a caminho da festa,
era velada mais uma célula morta
no rosto da moça
fábio gondim
a passagem da célula
Óleo sobre tela de Pedro Ivo
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ela lá na borda:

dum lado da fronteira um bento atemporal.
doutro aquele aumentado dez vezes.
da cima da linha põe um pé em cada esquina.

faz do circunflexo seu teto,
do til sua onda,
do resto seu alimento.

diz que cê cedilha
é letra pondo afora toda a obra falsa,
lassa e insossa,
escrita com um ou dois esses.

aos gritos e mornos assim diz,
porque metade de si é loucura
e a outra metade se cura

fábio gondim
raqueldialeto de bordaxetina (para Raquel, princípio ativo da cápsula)
*Arte: óleo sobre de tela de José Luis López Galván
Óleo sobre de tela de José Luis López Galván
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ela lá no centro:

bordando caminho com fio de ouro,
esculpindo tantas maçãs quanto necessárias
até essa gente morder o osso da língua.

da carne gerada em seu oco,
alegria rasgando boca;
sorriso estendido no rosto feito rede,
armado de orelha a orelha.

do chão se atira ao abismo dos céus
(ofício ensinado por manoel).

como faz se asas não tem?
escreve

fábio gondim
evavilridrato de centrotriptilina (para Eva, princípio ativo na fórmula da cápsula)
Óleo sobre de tela de José Luis López Galván
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ele lá no alto,

equilibrado no bambo fio da navalha:
numa mão a vertigem,
noutra o desejo de ser lelé.

quisera saísse à dança no compasso devido,
mas pula de dentro de si
para a precipitação dos dias de depois.

rodopia,
antes que o apanhador de sonhos chame o vento à salsa.

sua ansiedade é órbita de ponteiro
dois minutos antes da véspera.
sua lucidez tão intensa e breve
quanto uma pérola de naftalina

(fábio gondim)
eIiasborgianato de altobazepina (para Elias, princípio ativo da cápsula)
Óleo sobre de tela de José Luis López Galván

quinta-feira, 2 de julho de 2015

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o visgo da manga enroscado no vão de dentes,

o cheiro úmido da sombra da mangueira.

o apito do trem esparramando a rotina,
buscando o gosto de chipa da maracaju.
deixando o cheiro de bicho lacerado nos dormentes
e do esgoto peculiar dos vagões.

a brita nos trilhos,
a raiva chispante de aço
montado na alma das rodas,
rompendo a escuridão da vila.

de ansiolítico só melado com mandioca cozida.

a vida nos eixos da trilha
ao menos por aqueles dias

fábio gondim
br 267 km 366
A estação de Maracaju, data ignorada. Acervo Wanderley Duck
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teus laços que já foram meus noutros nós,

tua pele que já fora minha noutra boca...

guarda meu mundo em teu cabelo,
meu medo em tua saia de retalhos,
minha voz em teu coração.

e quando voltar da sala fria,
de ventre oco,
saiba que teus olhos é que darão luz
presses dias chinfrins.
um pra duas da manhã sem fim

fábio gondim
bilhete pré-operatório
"Carmen rocks" de Will Murai